A opção concreta de Luiz Sacilotto
Sendo um dos pioneiros no Brasil do concretismo, movimento que incluía em seu ideário a aproximação da arte com a indústria, a reprodução em série, era de se esperar que Luiz Sacilotto, desenhista, escultor e pintor por excelência, também fizesse sua incursão no terreno da gravura.
Esta incursão teve início em 1954, por intermédio de Hermelindo Fiaminghi, seu companheiro de movimento e experiente profissional no terreno das artes gráficas. Resultou desta associação duas lito-offsets denominadas “Permuta 1” (gravura 00) e “Permuta 2” (gravura 01). A estrutura formal destas gravuras originais é idêntica. Variam as cores. Na primeira o artista usou o verde e o violeta. Na Segunda permutou o violeta pelo vermelho. Em ambos os casos o resultado é muito convincente. Em “Permuta 2”, por exemplo, ele coloca lado a lado o vermelho com sua complementar em cor-pigmento, o verde. Estas duas cores formam o mais vibrante par entre as complementares. As formas rigorosas e as cores chapadas estabelecem entre si um diálogo instigante, que suga o nosso olhar e o convida a mudar permanentemente de um para outro dos quatro retângulos principais contidos no retângulo maior.
Semelhante à estrutura formal destes trabalhos tem a Gravura 4, obra serigráfica realizada 20 anos depois, também ela constituída de um retângulo que, dividido ao meio na horizontal e na vertical, dá origem a quatro outros retângulos, dois pretos e dois amarelos, sobre os quais aparece um outro retângulo maior constituído por faixas e ele próprio dividido em dois outros retângulos pela linha que surge da interseção das faixas. O resultado plástico deste trabalho, com sólida base geométrica, é simplesmente extraordinário. O que faz dele uma obra-prima? A modulação entre os tamanhos e as formas das áreas geométricas, o preenchimento destas áreas com duas cores que se sabe magníficas para aparecerem uma ao lado da outra – o preto e o amarelo – e a intensidade de cada uma destas cores em relação à outra.
Estas três obras, assim como as demais incluídas nesta exposição – 31 serigrafias em parceria com Gentil Faccini, e uma litografia produzida com o concurso de Roberto Gyarfi – não incluem imagem que representam pessoas, animais, coisas. Por isso é que se diz que este tipo de obra não representa, mas se presenta. Elas são elas mesmas e nada mais. No entanto, elas concretizam uma certa forma de pensamento. Seria impossível analisar cada uma delas no espaço deste catálogo. Deixemos para o espectador a aventura de descobrir ele mesmo a lógica e a poética de cada uma.
Esta mostra expõe, de maneira clara, o pensamento organizado e sensível de Luiz Sacilotto. É um resumo, no papel, de uma das mais vastas e preciosas obras concretistas realizadas na América Latina… E, seguramente, uma das obras mais consistentes realizadas entre nós em qualquer segmento das artes plásticas. Uma obra que tem seus fundamentos na beleza da forma pura, na cor chapada, na modulação competente entre estes elementos, nas relações dinâmicas entre fundo e forma. Com efeito, Sacilotto utilizou como poucos as leis da estrutura preconizadas por Max Bill, consubstanciadas no alinhamento, no ritmo, na progressão, na polaridade, na lógica interna do desenvolvimento e construção. Seu trabalho concilia exemplarmente rigor e liberdade, condição que tem ensejado o surgimento de obras consistentes e duradouras em todos os segmentos da arte.